Confrontar o passado, escavar memórias e transformar o que é íntimo em algo que pode ser compartilhado: a escrita de si é um exercício que requer fôlego e coragem. Isso porque para além de colocar-se no relato fiel da realidade, a escrita de si nos insere no campo não linear da lembrança. As partes recordadas, analisa-se; as partes não lembradas, cria-se.
Ao escolher o que narrar e o que silenciar, vamos reconstruindo outras versões de nós mesmos. Como em Confissões, de Rousseau, ou em Eu sei por que o pássaro canta na gaiola, de Maya Angelou, o “eu” da escrita é sempre mais do que uma pessoa: são novos mundos.

A escrita de si é um testemunho. Escrevemos para saber quem fomos, para entender o que, daquilo que éramos, decantou e o que ainda rodopia no líquido da existência. Escreveremos para descobrir quem seremos, a partir do que sedimenta e do que rodopia. E para, principalmente, inventar quem podemos ser.
Uma obra-prima da Escrita de si:
Lá embaixo, de Leonora Carrington
Lá embaixo é o relato autobiográfico de um dos períodos mais sombrios da vida de Leonora Carrington: a dolorosa experiência como interna de um hospício. Por meio de uma narrativa mágica e iniciática, usada como resposta contra a “pouca realidade” que vivenciou durante sua reclusão, a escritora faz do hospício um lugar encantado. Assim, seria mais correto afirmar que esse livro “não foi escrito – e sim tecido”, em face de acontecimentos traumáticos experimentados no próprio corpo. Entre a ferida aberta e a cicatriz que costura a superfície, a trama evoca fantasmas de silêncio e dor. André Breton, impactado com a leitura do livro, fez o seguinte comentário: “Retornando de uma dessas viagens das quais temos poucas chances de voltar, e que relatou em ‘Lá embaixo’ com uma precisão avassaladora, Leonora Carrington mantém a lembrança das margens que visitou, sem se desesperar por tocá-las novamente e, desta vez, sem ter que desferir golpes, munida de uma permissão para circular à vontade nas duas direções”. O projeto gráfico de Lucas Blat recebeu os seguintes prêmios: medalha de bronze do Brasil Design Award (2022) e medalha de prata no LAD – Latin American Design (2022).
Tradução: Alexandre Barbosa de Souza Apresentação: Diogo Cardoso Posfácio: Marcus Rogério Salgado
Escrita de si, a próxima edição do PLONGÉE, nossa oficina de escrita, ainda está com vagas abertas. Você pode se inscrever aqui ou assinar, com desconto, o percurso completo, que vai até junho — e que contará com mais duas imersões temáticas: memórias e Oulipo.
__
Até lá,
ESCRI.
👏👏👏👏👏👏
Ohhh